''ÍCONES"
Artigo do Pe. João Zecchin,
Publicado no Jornal Bragança Jornal Diário.
Foi
gratificante visitar a exposição de arte de Sérgio Prata, sob o título
"Ícones - Tradição e Contemporaneidade". A mostra permanece
até 27/12 deste ano, na "Dida Decorações". A indicação é
para serviço ao leitor. Mas a intenção não é comercial.
A expressão "Tradição e
Contemporaneidade", que subtitula a exposição, chamou-me a atenção,
pelo interesse natural que sinto pela arte.
Não sou conhecedor de arte. Sou
apreciador. Quem mergulha na água não precisa saber qual seja sua
composição química para se deixar molhar. Essa percepção transcende a
informação científica. Que é muito útil, mas não é essencial.
Além disso, a arte precisa do
apreciador, como um palestrante precisa do público ao qual fala. Ninguém
fala num recinto vazio. O interlocutor é fundamental. Porque a arte é
uma comunicação. E uma comunicação peculiar. Por isso, acompanha a
Humanidade desde o seu berço. Como necessidade espontânea e dupla. De
quem fala por ela e de quem a recebe e sente. Só o ser humano produz arte
e só o ser humano é capaz de a sentir.
E mais: o artista é sempre o
profeta do seu tempo. É aquele que, de um lado, percebe mais
profundamente a realidade que o cerca, vendo mais que o comum da
sociedade. E de outro, tem natural capacidade de exprimir melhor aquilo
que sente. Sua linguagem é mais profunda, mais expressiva e mais
penetrante.
Sérgio Prata é isso, naquilo que
faz. O objetivo do artista não é ser diferente. Isso é coisa que
qualquer um pode fazer. O artista é o que tem algo pessoal a dizer e o
diz dentro de sua individualidade. Que é absolutamente única, inédita.
Não é assim o nosso tempo. Nosso
tempo "fabrica artistas". E o faz por interesses.
O artista produz por necessidade.
Assim como respira por necessidade. Sem a respiração o corpo morre. Sem
a produção artística, o artista sente-se sufocado. Ele não pode não
produzir. E isso é ser artista. É perceber um tesouro interior e não
descansar até dividir esse tesouro com seus companheiros de existência.
A chamada arte contemporânea
padece de um mal muito sério. É a fuga do passado. Nega-o como alguém
que foge de alguma coisa. Quer ser diferente, pelo simples e estéril
prazer de ser diferente. Pela decisão de fazer algo que ninguém fez até
agora. Como se estivesse numa competição, para bater o recorde. Isso
esvazia a arte verdadeira.
O artista é original. Mas não por
fugir de alguma coisa. Mas por ter algo novo a dizer. Não para competir e
desbancar rivais. Mas para enriquecer ainda mais o patrimônio de beleza
que a grande alma do passado produziu para construir e contribuir.
Os ícones de Sérgio Prata são
exatamente isso. Têm algo diferente, mas são ícones. Não perdem sua
natureza, mas enriquecem a linguagem iconográfica. Olham respeitosamente
para o passado e oferecem alegremente uma forma transformada de continuar
a falar, como uma árvore, que não deixa de crescer e de se consolidar,
numa constante maturação, mas sem deixar de ser a árvore enraizada na
verticalidade da alma humana.
O ícone é uma fala espiritual.
Tanto assim, que a quase totalidade da produção iconográfica está
estreitamente ligada à religiosidade.
O ícone é como se alguém, do
lado de lá, pintasse na janela transparente do céu a imagem do que viu lá
dentro. Para que os da terra possam ver. Não para comover e seduzir. Mas
para propor intimidade e aconchego. Para aproximar a amizade da terra com
o céu.
Por isso o ícone é sereno.
Transpira beleza, sem sacudir quem o observa. Como um olhar tranqüilo, que
contempla com doçura, como a dizer que só o amor vale e que a paz virá
um dia, sem data ou pressa, para mostrar que o amor é possível e
universal.
Enfim, se foi com amor que Deus
criou, ninguém conseguirá arrancar essa raiz. E o orvalho paciente, que
vem do alto, fará florirem todas as coisas boas sonhadas.
O ícone fala de Deus. E das coisas
de Deus.
Isso tudo me agradou, e muito, na
exposição de Sérgio Prata. Que tenho como amigo. Que considero artista
sério. Que sabe respeitar o divino. Que sabe respeitar o humano. Que sabe
respeitar o tempo. Que sabe, sobretudo, respeitar a arte.
Algum leitor poderá dizer: - Mas
eu não sei o que é ícone!
Não sabe? Tudo bem. Então vá
ver. É sempre bom aprender. E arte é algo especial!
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